terça-feira, 19 de junho de 2007

A Vida do Negro

A Vida do Negro

Só se pode compreender o negro a partir da sua posição no cosmos. Enquanto perdurar o logicismo e o racionalismo próprios dos europeus e dos norte-americanos (herdeiros no Novo Continente dos modos de pensamento, dos valores e dos conceitos prevalentes nos antigos colonizadores), não se compreenderá o negro.

A história, as ciências, a filosofia e todas as demais províncias do saber humano nos últimos dois mil anos no Ocidente "ignoram" as diversas formas de conhecimento e de cultura existentes na África, "esquecendo", pois era conveniente "esquecer", que uma das formas mais abstratas de raciocínio, a matemática, surgiu no Egito, numa época em que aquele país era muito mais negro do que branco, Seria desnecessário igualmente lembrar a origem dos diversos grupos étni­cos hoje considerados brancos e que tiveram sua origem negra. Por­tanto, a mestiçagem sempre foi um fato incontestável na formação do homem ocidental.

O negro, por sua natureza, é um ser social, gregário, como queria Aristóteles, diferentemente do homem em ocidental que surgiu com e após o Renascimento com fortes traços individualistas, em que o rompimento com o passado recente (a Idade Média) representou também a ruptura dos laços que o ligavam a Deus, Ora, o negro concebendo Deus como uma "vis", isto é, como força, energia, cons­truirá toda uma cosmogonia a partir da manifestação dessa força, presente em todos os seres e todas as formas existenciais, Assim, Deus, a fonte suprema, o início e a origem de tudo, é, também, o fim a que todas as coisas se destinam e se desintegrarão. Neste MOVIMENTO ENERGÉTICO, o negro, notadamente o negro afri­cano, irá valorizar a intuição como método de conhecimento, Cha­mem-na, a intuição, com o nome que se queira dar, mas é no sentido místico - tão bem captado por Bergson e por Chardin - que o negro construiu a sua metafísica, o seu modo de conhecer o ser.

A partir daí, poder-se-á entender a música, a dança, a organi­zação familiar e social, a estrutura econômico-político negro, enfim, compreendê-la como uma manifestação da energia divina, assim como os animais, os vegetais, os minerais, sabendo, contudo, que o homem é a forma de energia ou o ser que pode canalizar todas as energias ao seu criador. O "bem" ou o "mal", depende do uso que se faz dessa energia.

Assim sendo, sem nos aprofundarmos na questão, transpondo os traços da cultura para o Brasil e limitando-nos à realidade brasi­leira pode-se compreender (sem entrar na análise da brutal estrutura sócio-econômico-política que marginalizou o negro durante e após a escravidão) a cordialidade, a paciência, o saber esperar do negro, pois o tempo, ora o tempo, por que falar em tempo? - só existe em função de algum objetivo, e este fim, que pensaram haver des­truído ao dizimarem a República de Palmares, universalizou-se em todo o território brasileiro. O Brasil é hoje um "grande Palmares".

É este Brasil palmares, este Brasil mestiço, que os cientistas so­ciais oficiais teimam em dizer que é uma DEMOCRACIA RACIAL - comentários à parte -, consciente da sua esmagadora maioria jamais deu atenção aos arreganhos dos que pensam ou se supõem ser a maioria étnica deste País. O problema não é saber se o maior contingente humano é formado por brancos, negros, índios (brutali­zados e dizimados), mestiços e outros que a nós se juntaram para formar, construir, para viabilizar, não somente a primeira civilização nos Trópicos, mas, sim a primeira civilização mestiça nos Trópicos. O que interessa ao homem de cor, como alguns pedantes insistem em tratar mais de setenta por cento da população brasileira, é oferecer a sua contribuição ao País, seja nos projetos contingenciais, mas, sobretudo, que se instaure no Brasil uma ordem econômica, social e política que seja a superação do que existe, tanto das diversas for­mas de capitalismo como dos variados socialismos para uma estru­tura sócio-político-econômica em que o homem possa realizar-se plenamente, sem perder as raízes históricas.


Um pronunciamento como o do eminente, humanista, culto e lúcido Senador Itamar Franco, político que honra e ilustra a notável galeria de homens públicos de Minas e do Brasil apoiado por todas as lideranças do Senado da República, não só dignifica o homem político brasileiro, mas é o ponto de partida para o Novo Brasil.

Waldimiro de Souza Líder de Comunidade Negra.

Igualdade e Participação do Negro:

Igualdade e Participação do Negro:
O Clamor do Senador Itamar Franco

O Congresso Nacional, por sua natureza e tradição, é o cenário propício para a defesa dos Direitos Humanos. Não se trata de coincidência, pois, verificar que os grandes vultos de nossa nacionalidade que se posicionaram contra a discriminação racial tiveram e têm assento nas Casas do Poder Legislativo.

Prova inconteste é o pronunciamento do Senador Itamar Franco, que mereceu o caloroso apoio das lideranças no Senado Federal, ao registrar nos Anais da Câmara Alta o “Dia Internacional para Elimi­nação da Discriminação Racial”, instituído pela Organização das Nações Unidas, a fim de que os povos se lembrem do brutal mas­sacre de Sharpeville e deem sua participação na luta contra o apartheid.

Poderiam os desavisados indagar: Não é o Brasil uma “demo­cracia multirracial”? Não há entre nós a Lei Afonso Arinos, que proíbe qualquer forma ou manifestação de discriminação racial? A nossa população não é hoje constituída de mais de setenta por cento de mestiços, segundo se estima? Como falar em racismo no Brasil? São indagações do homem comum, na maioria das vezes incons­cientes, que repetem estereótipos daqueles que se ocultamt no anoni­mato e que praticam aquela odiosa e cruel forma de racismo ao dizer que “o negro conhece o seu lugar” e coisas que-tais. Quem ousará di­zer que jamais ouviu ou presenciou formas veladas ou dissimuladas de racismo?

A pior manifestação de racismo, contudo, não é a que se pratica no acesso do negro ou do mestiço na escala sócio-econômico-política, opondo-se-lhe obstáculos de toda ordem. A mais dolorosa, a mais tristemente sofrida situação do negro e elo mestiço no Brasil, consiste em não poder realizar “uma dupla aspiração”: “a aspiração à igual­dade e a aspiração à participação; trata-se de dois aspectos da dignidade do homem e da sua liberdade”, como asseverou Paulo VI na Carta Apostólica ao Cardeal Maurice Roy, por ocasião do 80° aniversário da Encíclica Rerum Novarum, no dia 14 de maio de 1971.

Obviamente que Paulo VI falava de um modo geral, ao tratar das aspirações fundamentais e correntes de ideias num mundo em que o progresso científico a altera a paisagem do homem, principalmente quando se desenvolve "a sua informação e a sua educação".

Identificamos aqui a posição do homem brasileiro, o que vale dizer, daquele contingente de setenta por cento da nossa população constituído pelos negros e seus descendentes e que são, também, na sua grande maioria, os moradores das favelas, dos mocambos, das palafitas e que não participam das oportunidades de trabalho, de consumo, de bem-estar e tampouco se beneficiam das conquistas culturais e tecnológicas. Daí a oportuna advertência do ilustre Se­nador Itamar Franco: “A sociedade brasileira só será, realmente, aberta, justa e equânime quando agregarmos todos os seus segmentos - como os negros - ao desenvolvimento da Nação”.

Eis o que deseja, o a que aspira, o que quer o Brasil mestiço: “igualdade” e “participação”. Qualquer sociedade só será, de fato, “aberta, justa e equânime”, isto é, democrática, quando houver igual­dade e participação. O repúdio a quaisquer ideologias impostas, vio­lentadoras da dignidade do homem e da sua liberdade, é o funda­mento da "Carta de Uberaba" e da Proclamação de Ribeirão Preto: “O negro sob a visão política do estadista da República dos Palma­res no Brasil de hoje”

Liberto e descompromissado de e com quaisquer sistemas eco­nômicos e políticos, o negro no Brasil, como muito bem observou a antropóloga negra americana, Ângela Gillian, diferentemente do negro americano que luta por um acesso ao sistema lá vigente, aqui, ao contrário, segundo a antropóloga, “parte da crítica ao capitalismo, e da relação entre o capitalismo internacional e a situação em que ele vive, sem perder a perspectiva histórica”.

Muito mais do que uma crítica a determinado sistema econô­mico, mas, sim, procurando através de forma desinteressada pro­mover no corpo social as convicções culturais e religiosas de um povo nas suas relações com a natureza, acerca da função do homem no mundo, da origem e do fim do homem, a partir daquele “movi­mento energético”, de que fala Waldimiro de Souza - inspirador e animador de vários movimentos afro-brasileiros , e, consequente­mente, da própria sociedade.

Este o Brasil novo, o Brasil mestiço que o jovem Senador Itamar Franco, que honra e enobrece a admirável estirpe dos homens pú­blico, mineiro, anunciou Nação brasileira.

Miguel Setembrino Emery de Carvalho
Professor de História .

Carta do Deputado Carlos Santos

Carta do Deputado Carlos Santos
Brasília, 16 de abril de 1980

Eminente Senador Itamar Franco, Saúde e Paz!
No preciso instante em que Vossa Excelncia, engalanando a nossa mais alta tribuna política, falava para o Brasil sobre o "Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial", ali mesmo, o Senado da República, soberba e oficialmente, incorporava-se aos entreveros santificantes da reação coletiva e cívica contra a bruta­lidade doentia do racismo.

Como se reivindicado houvesse para mim o privilégio sublime de resguardar as excelencias da negritude - pelo que nela se recama a dignidade suprema da Pessoa Humana, em termos de florões do espírito, "órgão da vida eterna", como diria Rui - tenho saturado os Anais da Câmara Federal com o fervor da fala sem ódio e sem prevenção, sempre, porém, ungida de orgulho do sangue, da origem, do berço sobretudo, do papel histórico do Negro no bojo da nacio­nalidade nascente.

Se nos arreganhos racistóides, porém, que aqui e ali vão repon­tando nos escaninhos da Pátria, é a voz negra isoladamente que se projeta vanguardeando as reações salutares - o que em parte se admite e compreende -, nos momentos de memoração simplesmente cívica de exaltação pondunorosa dos fatos e dos homens que pau­taram no tempo os momentos de grandeza aEro-brasileira; a home­nagem é bem que não partisse de nós, pois numa esplendente mos­tragem do embasamento da nossa decantada "sociedade multirracial" o Negro aí deveria ser, tão-só, no calor das reverencias, motivo cívico e não raíz geradora; tão-somente alvo e não mola impulsora; nobre efeito, apenas, e não causa ufanosa.

É como fez o meu Rio Grande do Sul, nos idos de 1969, quando ao ensejo do Bicentenário da Colonização e Imigração, envolveu toda a estirpe ebanizada nos florões da gratidão do Estado e nas galas das homenagens oficiais.

Não foi diferente a postura altiva e patriótica de Vossa Exce­lencia, em fazendo de seu primoroso discurso o brado mesmo do próprio Senado Federal, solidário com a luta universal contra a abjeção do racismo.

E local outro mais indicado para tão vibrante manifesto de sadia hrasilidade, de patriotismo sem dobra nem jaça, é certo que não se ofereceria.

Casa maior do Povo, centro aglutinador das mais castiças vir­tudes de brasileira gente, o Senado Federal, na virilidade da fala de Vossa Excelcncia, se fez crisol da mais soberba conceiruação da unidacle espiritual do nosso povo. sem o que a idéia de Pátria re­dundaria em mera ficção.

Evocando as "nossas raízes africanas, que modelaram uma nação mestiça e uma civilização tropical", Vossa Excelência põe em relevo o ahsurdo, o ridículo, o incoerente, o ilógico, o esdrúxulo das cogi­tações dc raça no seio de um Povo como o brasileiro, em cuja nacio­nalidade está implícita a preponderância do "papel do negro e do mestiço na nossa formação étnica, na sua força de trabalho em nossa economia e as suas notáveis contribuições fundamentais no campo cultural, artístico, Iingüístico e nos costumes. Enfim, o seu real posic!onamento no contexto social brasileiro".

E então, Vale a magistral oração de Vossa Excelência por uma solene advertência aos brutos da raça pura", aos bobos da corte sem garbo de Gobineau, que por aí afora andam perdidos no pró­prio desajuste mental para a ambiência democrática e, pior ainda, inépcia moral para o resguardo da nossa realidade esplendente como Pátria livre e soberana; pois fazem da coloração epidérmica - con­dição simplesmente acidental - fator de discriminação social e, desta, a mais repugnante razão de quebra de unidade espiritual, que é a esslência mesma do ideário de Pátria.

Não se fustiga a estima, nem a benemerência, nem os brios dos paladinos da jornada gloriosa da Abolição, quando se afirma ter ficado abcrto no tempo o ciclo histórico de 13 de Maio .

A quebra dos guilhões de ferro ou o destroço das senzalas imun­das; a extinção oficial do Iabéu escravagista ou a decretação formal da liberdade física; a proclamação ruidosa da Abolição ou a queima inócua do arquivo escravocrata; a transformação do "escravo-coisa" em gente ou da gente em cidadão; nada disso exauriu os ideais de grandeza moral da geração preordenada que projetou no painel da História o 13 de Maio de 88.

O"Todos são iguais perante a lei" que reluz no texto da nossa Carta Magna, não evitou. nem dispensou a Lei Afonso Arinos, de tão enervante ineficácia.
o próprio Autor, o eminente jurista, Afonso Arinos, confessa-se desapontado e declara aos jornais que nunca houve punição escudada na Lei em tela, embora registre vinte e sete anos de vigencia, infeliz­mente sem a mínima aplicação.
Diz mais: que ao contrário, o problema se agravou na Última década, em função do esplendente surto industrial no País, real­çando, textualmente, que "temos uma classe de ricos mais numerosa, quase todos com sangue negro nas veias, pelo que eu mesmo cons­tatei. Mais são racistas, apesar de mestiços, ou então, por causa disso mesmo" .

A Carta de Uberaba que os negros ali reunidos dirigiram ao Governo e à Nação, emoldura o posicionamento político que devem tomar, com os olhos e o pensamento voltados para a sua plena, imperiosa e patriótica integração nacional.

E por reunir e expressar o importante documento um punhado ele "aspirações e sentimentos elo Brasil mestiço" houve por bem Vossa Exclência honrar seus autores, ao transformá-lo em parte integrante de sua memorável oração.
Tem, ele fato, a política, papel primordial no escopo superior da ascensão social do negro brasileiro.

Não, porém, como Minoria, integrante que é da comunidade brasileira, sem diferença ele língua, de religião, de costumes ou de qualquer outro elemento que o tornasse estranho à comunhão na­cional.

Ele tem de ser convocado, aproveitado e dignificado no setor político como cidadão, na mais rigorosa igualdade de condições, sob a égide do direito da absoluta igualdade que a Lei lhe outorga, ­artífice que foi, pelo sangue, pela ternura, pelo sofrimento e pela re­núncia, da obra gloriosa da construção da pátria nacionalidade.

Por tudo quanto aqui em forma de letra, o coração diton. Com a chancela das emoções mais vivas e naturais, rogo se digne Vossa Excelência receber e aceitar as minhas congratulações pelo brilho da forma, excelência do conteúdo e moldura de requintada brasili­daele da magnífica oração com que registrou, nos Anais do Senado Federal, o transcurso do "Dia Internacional para Eliminação da Dis­criminação Racial".

Com elevada estima e não menor admiração, creia-me, fraternalmente - Deputado Carlos Santos.


Dados Básicos:
Data de Nascimento:
09/12/1904 (Falecido em 09/05/1989)
Local de Nascimento:
Rio Grande do Sul, RS
Legislaturas:
1975-1979 e 1979-1983.
Mandatos (na Câmara dos Deputados):
Deputado Federal, 1975-1979, RS, MDB. Dt. Posse: 01/02/1975;
Deputado Federal, 1979-1983, RS, MDB. Posse: 01/02/1979.
Filiações Partidárias:
ARENA; MDB
Condecorações:
Comenda Pro Eclesia et Pontifice - Papa João XXIII, 1960. Recebeu igual Comenda do Papa Paulo VI, 1967.
Estudos e Cursos Diversos:
Estudos iniciais no Liceu Salesiano Leão XIII e nos colégios estaduais Nossa Senhora do Rosário e Lemos Júnior; Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais - Faculdade de Direito de Pelotas, da Universidade do Rio Grande do Sul, 1950.
Obras Publicadas:
Predestinação do Direito, Tip. Leão XIII, 1950.
Atividades Parlamentares:
CÂMARA DOS DEPUTADOS: COMISSÕES PERMANENTES: Relações Exteriores: Membro efetivo, 1975.CPI: Problema do Menor: Membro efetivo, 1975, e Presidente, 1975.

Continuação do Discurso do então Senador Itamar Franco

O Sr. Mauro Benevides - Permite V. Ex. um aparte?
O SR. ITAMAR FRANCO - Ouço V. Ex:
O Sr. Mauro Benevides - Senador Itamar Franco, sabe V.
Ex: que, nesta Casa, sou um dos representantes do Estado que em nosso País foi um dos primeiros a redimir os escravos, pondo fim àquele regime de opressão que predominava na século passado. E, no instante em que V. Ex?- se reporta ao problema da discrimina­ção racial, desejo ressaltar que o nosso partido, o Partido do Movi­mento Democrático Brasileiro, fez questão de inserir em seu pro­grama um capítulo referente aos negros, condenando todas as for­mas de discriminação e defendendo a participação dos negros no processo político brasileiro. Muito grato a V. Ex:
.o SR. IT AMAR FRANCO - Sou eu quem agradece, Senador Mauro Benevides, não só o registro histórico que V. Ex: referiu, em relação ao seu Estado, roas sobretudo também lembrando o aspecto partidário, em que o nosso partido se apresenta também, com firmeza, nessa luta contra a discriminação racial.
O Sr. Aloysio Chaves - Permite V. Ex: um aparte?
O SR. ITAMAR FRANCO - Com muito prazer ouço V. Ex: O Sr. Aloysio Chaves - Desejo, nobre Senador Itamar Franco,
adicionar ao discurso de V. Ex: algumas observações que nele es­tão implicitamente contidas. V. Ex:- sabe que dentro do processo histórico, tradicional, no Brasil, não se fez essa discriminação racial. Aliás, um dos traços mais notáveis da civilização portuguesa é o seu caráter multirracial. Tanto assim, que agora quando a Europa enfrentou esse grave processo de descolonização, Portugal foi pra­ticamente o último país a ser afastado do Continente Africano. En­tretanto, por influências exógenas esse sentimento poderia ser esti­mulado, cultivado no Brasil e, coerente com a nossa tradição his­tórica e cultural, o eminente homem público, o grande jurisconsulto e ex-parlamentar Afonso Arinos de MeIo Franco é autor de uma lei que recebeu o seu nome, proibindo exatamente qualquer tipo de discriminação racial, em qualquer atividade administrativa, cultu­ral, social ou política do País. Esta lei está em pleno vigor, pela qual tanto devemos nos bater e, sem dúvida alguma, será o instru­mento eficaz para evitar que brote de qualquer maneira, em qual­quer camada ou em quafquer segmento da população, um senti­mento que venha contrariar essa tradição histórico-cultural brasi­leira. Também o nosso Partido, o Partido Democrata Social, inseriu no seu programa, com destaque, como ponto fundamental, o com­bate a toda espécie de discriminação, inclusive a racial, da mesma maneira como o fez o nobre Partido de V. Ex: conforme acaba de registrar o nobre Senador Mauro Benevides. Congratulando-me, portanto, com o pronunciamento de V. Ex: considero-o necessário e conveniente para evitar que qualquer resquício de preconceito racial possa, sob forma, mesmo dissimulada, surgir neste País, con­trariando a nossa tradição histórico-cultural.
o SR. ITAMAR FRANCO - V. Ex: há de ter a oportunidade de verificar, no decurso do meu discurso, que focalizo bem o aspecto brasileiro, evidentemente destacando a sua singularidade neste pro­cesso de discriminação racial. Mas também lembramos que essas maiorias estão um pouco abandonadas em relação a determinados aspectos do nosso Brasil. Muito obrigado a V. Ex: pela sua. in­tervenção. Continuo, SI. Presidente:
Agiganta-se, essa fecunda experiência histórica, no cenário in­ternacional, como paradigma de nova era nas relações entre raças e povos e, ao mesmo tempo, encerra o ciclo de um processo social abominável, de triste memória, indefeso à luz da civilização, porque odiosa, sob todos os aspectos, é a discriminação racial.
Identificam-se nesta vitória, democracia, liberdade, respeito aos Direitos Humanos, confraternização do elemento nativo.
Mugabe, um desses autênticos líderes populares, que emerge do
"status" político, diz:
"Estamos começando um capítulo inteiramente novo em nossa História. A guerra acaba de terminar. Estamos em paz. Não precisamos de lei marcial, nem de prisões polí­ticas desnecessárias. Pessoalmente, as ditaduras me causam repugnância. O racismo, é claro, terá de ser abolido ime­diatamente. Queremos que todos possam ter plena partici­pação e o direito democrático de tomar suas próprias qe­cisões. Quanto ao "apartheid" da África do Sul, podemos e devemos denunciá-lo nas Nações Unidas e junto aos paí­ses não-alinhados."
Para nós, brasileiros, dadas as nossa raízes africanas, que mo­delaram uma nação mestiça e uma "civilização tropical" - o que ocorre em Angola, Zimbabwe e Moçambique, nos interessa de per­to e nos úbriga a refletir mais profundamente no preponderante papel do negro e do mestiço na nossa formação étnica, na sua for­ça de trabalho em nossa economia e as suas notáveis e fundamen­tais contribuições no campo cultural, artístico, lingüística e nos costumes. Enfim, o seu real posicionamento no contexto social bra­sileiro.
E mais ainda: faz-nos questionar com maior seriedade e de­terminação a problemática do negro em nossa sociedade, suas con­dições de vidas, seus anseios e necessidades e, acima de tudo, a conscientização de seu status atual.
Tal conscientização, em verdade, já pode ser observada. Vá­rios movimentos, em todo o Brasil, estão originando-se agora co­mo força de aglutinação e participação do negro na vida nacional, objetivando a melhoria e a qualidade de sua existência.
O Sr. Lomanto ]únior - Permite V. Ex: um aparte?
O SR. ITAMAR FRANCO - Com muito prazer, nobre Sena­dor.
O Sr. Lomanto ]únior - Nobre Senador Itamar Franco, eu me congratulo com V. E: pelo registro oportuno que faz da data comemorativa do Dia Mundial Contra a Discriminação Racial. Par­ticipei na semana passada, no Ministério das Relações Exteriores, de uma magnífica reunião presidida pelo Chanceler brasiileiro, Mi­nistro Saraiva Guerreiro, onde tivemos a oportunidade de ouvir uma brilhante palestra, magistral palestra mesmo, proferida pelo Ministro Eduardo PorteIla, da Educação. O registro que V. Ex: faz nesta tarde, repito, é um dos mais oportunos e eu não poderia dei­xar de me congratular com V. Ex:, como representante de um Es­tado onde predominou no passado, e ainda tem marcas profundas no presente, a raça negra, a qual muito ajudou o 'desenvolvimento de meu Estado e que é, sem dúvida alguma, parte integrante da sua cultura e enriquece o seu folclore. Portanto, gostaria de trans­mitir a V. Ex~ os meus cumprimentos e dizer que me solidarizo com V. Ex:, quando registra no Senado da República as justas co­memorações que o mundo inteiro faz pelo Dia Mundial contra a Discriminação Racial, o que ainda é, infelizmente, mácula - má­cula terrível - que de qualquer maneira atinge a fundo a Huma­nidade. Precisamos todos unir os nossos esforços para que possa­mos escoimar, de uma vez por todas, a discriminação racial que se constitui numa vergonha para o mundo.
O SR. ITAMAR FRANCO - Muito obrigado, Senador Lo­manto Júnior. É verdade: quando se fala em discriminação racial a voz da Bahia não poderia ficar ausente.
O Sr. Gabriel Hermes - V. Ex: permite um aparte?
O SR. IT AMAR FRANCO - Com muito prazer, Senador Gabriel Hermes.
O Sr. Gabriel Hermes - Nobre Senador, a oportunidade do discurso de V. E xª", realmente, é a melhor possível, principalmentequando se fala em discriminação racial dentro de um País como o nosso, pois temos de nos unir para destruir qualquer "pontinho" que apareça nesse sentido. Não é somente a raça negra: sabemos o que aconteceu há bem poucos anos com a raça amarela, com os indianos dentro de sua própria pátria, com Mahatman Gandhi ­a maior alma talvez deste século, o maior libertador dos últimos tempos - o que ele fez para libertar aqueles milhões de indianos e também homens e mulheres do Paquistão, sem derramar uma go­ta de sangue. Verificamos como eram tratados, talvez pior do que os próprios negros; só não eram escravizados da mesma maneira mas talvez de ordem pior que a dos negros, porque eram estranhos e desprezados dentro da sua própria pátria. Quando eu ouvi há poucos dias - vou encerrar o meu aparte - essa figura admirável de brasileiro, o homem de "Casa Grande E Senzala", Gilberto Frei­re, falando na televisão, com os seus 80 anos, congratulando-se con­sigo mesmo, pela beleza e oportunidade de seu trabalho que correu o mundo, ressaltando a raça nova que nasce no Brasil, essa raça que ele considera, por todos os modos, e por todos os motivos, al­guma coisa de que ainda o mundo há de se honrar, produto da miscigenação do negro, do português, do branco e também de ou­tras raças: como árabes, indianos e de todas as partes do mundo, raças muitas que foram escravizadas de uma maneira ou de outra. Nós verificamos que não tem mais sentido a discriminação e temos razão de sobra, nós brasileiros, para nos honrarmos de sermos mis­turados, por todos os sangues, para podermos apresentar ao mundo um homem de uma Nação onde todos nasçam em qualquer parte de mundo, aqui encontram o mundo de todos, aqui é o lugar de um mundo só, para exemplo. Por isso eu me congratulo com V.E: principalmente destacando a figura extraordinária do negro, este negro que nós nos acostumamos a amar, sobretudo, quando crian­ça, quando eles ajudavam as nossas mães, nos dando carinho e muitas vezes nos dando o leite, e quase sempre nos dando muito amor. Congratulações a V. Ex:
O SR. ITAMAR FRANCO - Muito obrigado, Senador Gabriel Hermes, pela intervenção sempre lúcida de V. Ex: E ao destacar exatamente o negro, como diz V. Ex.:, destaco também os movi­mentos que se processam no Brasil em favor do negro.
Continuo, Sr. Presidente:
Em Minas, São Paulo e Brasília, nos últimos meses, realiza­ram-se encontros nesse sentido.
Brasileiros de todas as origens, reunidos no Triângulo Mineiro, por ocasião da Semana da Pátria do ano passado, ofereceram à Nação a "Carta de Uberaba", verdadeira proclamação de brasili­dade, que os Poderes constituídos devem examinar e meditar com atenção e interesse. Trata-se de documento sério, de forma supra­partidária.
Deram, com esta iniciativa auspiciosa, mais uma prova de to­lerância c cordialidade, tão próprias daqueles que fizeram a fortuna da coroa portuguesa e construíram a riqueza deste País.
Se o elemento negro foi, inquestionavelmente, o fator indis­pensável e presente em todos os ciclos econômicos do Brasil, desde o cultivo da cana-de-açucar à cultura do café, não se pode desconhecer que, com a descoberta das minas auríferas na região das Gerais, lá também, no nossso Estado, de bravas e heróicas lutas em prol da liberdade, o elemento negro, repetimos, participou ativa­mente no povoamento e progresso das terras mineiras.
Não foi, pois, aleatória ou gratuita a escolha de uma comuna de Minas - Uberaba - para local do primeiro encontro dos negros brasileiros. É em Minas Gerais que vamos constatar, nos registros da História Pátria, a figura indomável de Chico Rei, o negro que se notabilizou por não se deixar escravizar, por reconhecer que o homem nasce livre e assim deve permanecer.
O clamor da "Carta de Uberaba", pela causa e valores eternos ali contidos, iria, obviamente, frutificar-se. De 23 a 25 de novem­bro passado, já em terras paulistas, negros de diversos Estados encontraram-se em Ribeirão Preto para estudar e debater os seus problemas e a melhor forma de participação no processo histórico do País, tendo como inspiração e guia a figura maior de Zumbi, proclamador da República de Palmares.
Indagou-se muito nesses conclaves as razões da pouca parti­cipação do homem de cor nos destinos e na estrutura social da co­munidade.
Ora, se somos uma "sociedade multiracional", ética e cultural­mente falando; se temos convicção de que nosso embasamento eco­nômico calcou-se, fundamentalmente, sobre o braço negro; se "o senhor brallco já não pode permitir a marginalização daqueles que outrora guardava na casa grande e senzala", como afirma o sociólogo Gilberto Freire, que está, neste mes, em meio a várias homenagens, completando 80 anos, todos dedicados ao estudo da miscigenação e da cultura afro-brasileira.
O Sr. Leite Chaves - Permite V. Ex: um aparte?
O SR. ITAMAR FRANCO - Com muita honra.
O Sr. Leite Chaves - O nosso Partido, o Partido Trabalhista Brasileiro, se associa às homenagens de V. Ex: E como todos sa­bem um dos itens do nosso programa partidário é este, a luta contra a discriminação racial. Poucas raças serviram tanto ao Brasil quan­to a negra; e poucas foram tão violentadas quanto ela. Aliás, um dos episódios mais dolorosos da História do Brasil é aquele da fu­ga dos negros dos engenhos, já na proximidade da época da liber­tação, quando eles se juntaram no Quilombo dos Palmares para a defesa daqueles resíduos de liberdade que aguardavam alcançar um dia. E foi Domingos Jorge Velho, comandando a repressão, que pela primeira vez usou no mundo a guerra bacteriológica. Ele si­mulava prender negros contaminados de varíola, em seguida incita­va-os à fuga, para que, sendo homiziados pelos outros escravos no Quilombo dos Palmares tivessem a doença difundida por toda a comunidade. Foi aqui no Brasil onde primeiro se usou a guerra bacteriológica contra os pretos. Libertos, eles continuam margina­lizados. Oitenta por cento das favelas são constituídas de pretos, porque não se deu uma oportunidade maior para que economica­mente eles se soerguessem. Acho que já é tempo de se fazer justiça ao preto no Brasil. A primeira delas é a eliminação dos resíduos preconceituosos, porque somos um País de mestiços. E, aliás, é nessa miscelânia que está a força brasileira. Em seguida, uma ação mais eficiente no que diz respeito à sua recuperação econômica ou, pelo menos, uma possibilidade igualitária para que eles possam soerguer-se economicamente e dar a sua melhor contribuição ao País. Muito obrigado.
O SR. ITAMAR FRANCO - Nobre Líder do Partido Traba­lhista Brasileiro, Senador Leite Chaves, muito obrigado pela in­tervenção de V. Ex?- É exatamente sobre determinados aspectos, Senador Leite Chaves, que ouso hoje chamar a atenção do Senado Federal para o problema.
Sr. Presidente, já vou encerrar.
Por que então, excetuando-se as individualidades marcantes que ascenderam a posições de destaque e prestígio, o negro, o mu­lato, o mestiço, enfim, a grandc e esmagadora maioria do povo bra­sileiro, lamentavelmente, ainda não participa das decisões nacionais e não usufrui, como devia e merece, dos benefícios do progresso?
É, pois, em tempos de abertura que esses questionamentos de­vem ser debatidos, aqui no Congresso, nas praças públicas, nos púl­pitos, nas cátedras e na Imprensa, o que ora fazemos desta Tribuna.
Discutirmos a situação do negro no âmago da coletividade. Ve­rificarmos os erros, as omissões, os preconceitos que o têm levado à marginalidade social, econômica e cultural, desumana, sob prisma pessoal, e desagregadora da nacionalidade, ante os interesses cole­tivos maiores, para, então, capacitarmos suficientemente na via­bilização de soluções efetivas que a questão requer.
Faze-lo, enfim, co-partícipe dos frutos da riqueza, ensejando­lhe oportunidades, em condições iguais, de acesso à educação, em todos seus níveis, à ciência, a empregos e postos de relevo na ad­ministração pública e particular e que, garantindo-lhe remuneração condigna em seu trabalho e profissão, tenha moradia própria, saúde e lazer. Parodiando conhecida canção popular, diríamos que o ne­gro precisa ter vez!
A sociedade brasileira só será, realmente, aberta, justa e equâ­nime quando agregarmos todos os seus segmentos - como os ne­gros - ao desenvolvimento da Nação.
Em consonância a essas reflexões e atendendo às aspirações e sentimentos do Brasil mestiço, solicitamos que integrem os Anais do Senado Federal a "Carta de Uberaba" e o documento elaborado em Ribeirão Preto, denominado "O negro sob a visão política do estadista da República dos PaI mares no Brasil de hoje".
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Muito bem! Palmas.)

O NEGRO NO BRASIL - Brasília 1980

Discurso do Senador Itamar Franco


Sr. Presidente, Srs. Senadores:
"Povo! Povo infeliz! Povo, mártir eterno Tu és do cativeiro o Prometeu moderno."
Iniciamos com Castro Alves nosso pronunciamento esta tarde.
Ninguém melhor do que o poeta encarna, através dos tempos, a luta e o símbolo da raça negra no Brasil, que a heroificou, tão ge­nialmente, nos candentes versos de "Os Escravos". E o assunto que nos traz a esta tribuna fixa-se, essencialmente, sobre a posição do negro no mundo de hoje, especialmente na sociedade brasileira.
A última sexta-feira foi uma data particularmente significativa para os Direitos Humanos.
E nós que, nesta Casa, ao longo desses anos de atuação, ternos veiculada com insistência a temática dos Direitos Humanos, não poderíamos, no momento, ficar silentes ante urna de sua principais questões, qual seja, a segregação racial.
Comemorou-se, no dia 21 de março, com grande júbilo para aqueles que buscam e anseiam pelos Direitos do Homem, o Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial “, instituído pela Organização das Nações Unidas, através da Resolução no 2.506, de 21 de novembro de 1969, aprovada em Assembléia-Geral:
"Conclama-se a todos os Estados e organizações a come· morarem com cerimônias solenes o "Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial", em 21 de março de 1970 - o décimo aniversário do massacre de Sharpeville, em solidariedade ao povo oprimido da África do Sul e dar especiais contribuições para este dia em apoio à luta con­tra o apartheid ..
O ódio racial - sabemos todos - no curso da História, tem arrastado muitos povos ao desespero e à luta fratricida, infringindoinenarráveis sofrimentos a milhões de pessoas. O terror nazista contra os judeus, em tempos recentes, constituiu um tenebroso tes­temunho.
Séculos e séculos, entretanto, contemplam o racismo do homem branco sobre o negro na África.
A escravidão negra - abjeta, aviltante e desumana - brutali­zou o homem opressor e racista e aninializou o negro escravo,· co­mo se ele não tivesse sentimento, nem alma.
Essa nódoa infamante e cruel, praticada largamente pelos im­périos colonialistas europeus, a partir do século XVII, marchou às terras das Américas, que foram "adubadas" com o· sangue e suor do negro subjugado.
Terminado o tráfico africano, esse mesmo colonialismo implan­tou-se definitivamente em toda a África, submetendo, pela força e violência, os povos· e tribos da raça negra.
Após a II Guerra Mundial, sob a perspectiva de nova reali­dade internacional, os movimentos de libertação nacional surgem com grande vigor e pujança no continente africano e asiático.
Os povos começam a se libertar de um colonialismo anacrô­nico e anti-histórico e as potências imperialistas européias, muito a contragosto, compreendem, enfim, o término daquela época.
Algumas, inteligentemente, cedem; outras, mais recalcitrantes, teimam em resistir à implacabilidade do processo histórico.
"Toda noite escura tem um alvorecer brilhante", sentencia an­tigo provérbio persa. A independência das novas nações africanas ­consolidada na década de 60 - torna-se um imperativo e realidade inconteste naquele continente ..
Mas se o colonialismo morrera, nem assim a opressão da mi­noria branca. - descendente de antigos colonos - sobre a maioria negra, deixava de se impor, como se impõe ainda na África do Sul, na Namíbia e até muito recentemente na Rodésia - Zimbabwe.
Aí está o odiado apartheid, imposto pelo regime escravagista de Pretória, a desafiar a ONU e os povos que desejam a paz, a igualdade entre as raças e a liberdade.
Mas a História, Sr. Presidente, não se faz, por mais que se tente, com retrocessos e obscurantismos. Prova-o a edosão de movi­mento libertário nacionalistas, como a independência das ex-colô­nias portuguesas de Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde, e, já agora, a verdadeira revolução pelo ocorrido na Rodésia-Zimbabwe, com a eleição do líder Robert Mugabé e de uma maciça maioria negra para dirigir o país.
A vitória de Mugabé, em pleito direto e livre, transcende a ape­nas uma disputa eleitoral e extrapola, de muito, a uma questão in­terna naquela nação.
Exemplifica ela, na verdade, e de forma grandiosa, para o resto da África, a fraternidade racial e liquida com regimes racistas in­toleráveis, como o de Ian Smith que tanto infelicitou e estigmati­zou milhões de negros rodesianos.
O Sr. Gilvan Rocha - Permite V. Ex: um aparte?
O SR. ITAMAR FRANCO - Pois não, nobre Senador.
O Sr. Gilvan Rocha - No momento em que V. Ex: chama a atenção do Senado da República, sobre o problema racial, no mun­do, quero me congratular com V. Ex: pela oportunidade do assun­to. Todos nós sabemos que o Brasil não possui agudamente este problema, mas, nem por isso deixa de possuí-Io. A nossa decan­tada democracia racial, de vez em quando, se vê torpedeada por discriminações que um político moderno como V. Ex: não pode conceber de maneira alguma. Eu desejo acompanhar a esteira do pensamento de V. Ex:, dizendo que é nosso dever repelir esse re­crudescimento racial que parece estar vindo como um dos fenô­menos do fim do século XX. E dizer que, em nosso País, todo o cuidado é pouco no sentido de que não se deixe de proteger as minorias raciais, as minorias, aliás, de uma maneira geral. Eu, in­clusive, incluo nesse tipo de minoria, não uma minoria numérica, mas, uma minoria na participação da vida nacional, as mulheres. A discriminação sexual também é um fato no Brasil. Esta semana mesmo, nós vimos, escandalizados, uma notícia de que uma senhora teve que recorrer aos Tribunais Superiores para assegurar o seu lugar concurso público de Escrivã de Polícia, e mesmo assim não conseguiu a vaga que era dela por direito. Vê V. Ex: que ainda existem distorções do ponto de vista de discriminação neste País, que tem tudo para ser exemplo no mundo na democratização das suas minorias. Este é um assunto atual, sério e que V. Ex: levanta com a maior propriedade. Queira receber minha solidariedade e apoio ao discurso que tão brilhantemente V. Ex: está proferindo.
O SR. ITAMAR FRANCO - Muito obrigado, nobre Líder, Se­nador Gilvan Rocha, pela intervenção de V. Ex: a qual tão bem caracteriza o processo ainda hoje existente no mundo da discrimi­nação racial.