Carta do Deputado Carlos Santos
Brasília, 16 de abril de 1980
Eminente Senador Itamar Franco, Saúde e
Paz!
No preciso instante em que Vossa
Excelncia, engalanando a nossa mais alta tribuna política, falava para o Brasil
sobre o "Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial",
ali mesmo, o Senado da República, soberba e oficialmente, incorporava-se aos
entreveros santificantes da reação coletiva e cívica contra a brutalidade
doentia do racismo.
Como se reivindicado houvesse para mim o
privilégio sublime de resguardar as excelencias da negritude - pelo que nela se
recama a dignidade suprema da Pessoa Humana, em termos de florões do espírito,
"órgão da vida eterna", como diria Rui - tenho saturado os Anais da
Câmara Federal com o fervor da fala sem ódio e sem prevenção, sempre, porém,
ungida de orgulho do sangue, da origem, do berço sobretudo, do papel histórico
do Negro no bojo da nacionalidade nascente.
Se nos arreganhos racistóides, porém, que
aqui e ali vão repontando nos escaninhos da Pátria, é a voz negra isoladamente
que se projeta vanguardeando as reações salutares - o que em parte se admite e compreende
-, nos momentos de memoração simplesmente cívica de exaltação pondunorosa dos
fatos e dos homens que pautaram no tempo os momentos de grandeza
aEro-brasileira; a homenagem é bem que não partisse de nós, pois numa
esplendente mostragem do embasamento da nossa decantada "sociedade
multirracial" o Negro aí deveria ser, tão-só, no calor das reverencias,
motivo cívico e não raíz geradora; tão-somente alvo e não mola impulsora; nobre
efeito, apenas, e não causa ufanosa.
É como fez o meu Rio Grande do Sul, nos
idos de 1969, quando ao ensejo do Bicentenário da Colonização e Imigração,
envolveu toda a estirpe ebanizada nos florões da gratidão do Estado e nas galas
das homenagens oficiais.
Não foi diferente a postura altiva e
patriótica de Vossa Excelencia, em fazendo de seu primoroso discurso o brado
mesmo do próprio Senado Federal, solidário com a luta universal contra a
abjeção do racismo.
E local outro mais indicado para tão
vibrante manifesto de sadia hrasilidade, de patriotismo sem dobra nem jaça, é
certo que não se ofereceria.
Casa maior do Povo, centro aglutinador das
mais castiças virtudes de brasileira gente, o Senado Federal, na virilidade da
fala de Vossa Excelcncia, se fez crisol da mais soberba conceiruação da
unidacle espiritual do nosso povo. sem o que a idéia de Pátria redundaria em
mera ficção.
Evocando as "nossas raízes africanas,
que modelaram uma nação mestiça e uma civilização tropical", Vossa
Excelência põe em relevo o ahsurdo, o ridículo, o incoerente, o ilógico, o
esdrúxulo das cogitações dc raça no seio de um Povo como o brasileiro, em cuja
nacionalidade está implícita a preponderância do "papel do negro e do
mestiço na nossa formação étnica, na sua força de trabalho em nossa economia e
as suas notáveis contribuições fundamentais no campo cultural, artístico,
Iingüístico e nos costumes. Enfim, o seu real posic!onamento no contexto social
brasileiro".
E então, Vale a magistral oração de Vossa
Excelência por uma solene advertência aos brutos da raça pura", aos bobos
da corte sem garbo de Gobineau, que por aí afora andam perdidos no próprio
desajuste mental para a ambiência democrática e, pior ainda, inépcia moral para
o resguardo da nossa realidade esplendente como Pátria livre e soberana; pois
fazem da coloração epidérmica - condição simplesmente acidental - fator de
discriminação social e, desta, a mais repugnante razão de quebra de unidade
espiritual, que é a esslência mesma do ideário de Pátria.
Não se fustiga a estima, nem a
benemerência, nem os brios dos paladinos da jornada gloriosa da Abolição,
quando se afirma ter ficado abcrto no tempo o ciclo histórico de 13 de Maio .
A quebra dos guilhões de ferro ou o
destroço das senzalas imundas; a extinção oficial do Iabéu escravagista ou a
decretação formal da liberdade física; a proclamação ruidosa da Abolição ou a
queima inócua do arquivo escravocrata; a transformação do
"escravo-coisa" em gente ou da gente em cidadão; nada disso exauriu
os ideais de grandeza moral da geração preordenada que projetou no painel da
História o 13 de Maio de 88.
O"Todos são iguais perante a
lei" que reluz no texto da nossa Carta Magna, não evitou. nem dispensou a
Lei Afonso Arinos, de tão enervante ineficácia.
o próprio Autor, o eminente jurista,
Afonso Arinos, confessa-se desapontado e declara aos jornais que nunca houve
punição escudada na Lei em tela, embora registre vinte e sete anos de vigencia,
infelizmente sem a mínima aplicação.
Diz mais: que ao contrário, o problema se
agravou na Última década, em função do esplendente surto industrial no País,
realçando, textualmente, que "temos uma classe de ricos mais numerosa,
quase todos com sangue negro nas veias, pelo que eu mesmo constatei. Mais são
racistas, apesar de mestiços, ou então, por causa disso mesmo" .
A Carta de Uberaba que os negros ali reunidos
dirigiram ao Governo e à Nação, emoldura o posicionamento político que devem
tomar, com os olhos e o pensamento voltados para a sua plena, imperiosa e
patriótica integração nacional.
E por reunir e expressar o importante
documento um punhado ele "aspirações e sentimentos elo Brasil
mestiço" houve por bem Vossa Exclência honrar seus autores, ao
transformá-lo em parte integrante de sua memorável oração.
Tem, ele fato, a política, papel
primordial no escopo superior da ascensão social do negro brasileiro.
Não, porém, como Minoria, integrante que é
da comunidade brasileira, sem diferença ele língua, de religião, de costumes ou
de qualquer outro elemento que o tornasse estranho à comunhão nacional.
Ele tem de ser convocado, aproveitado e
dignificado no setor político como cidadão, na mais rigorosa igualdade de
condições, sob a égide do direito da absoluta igualdade que a Lei lhe outorga, artífice
que foi, pelo sangue, pela ternura, pelo sofrimento e pela renúncia, da obra
gloriosa da construção da pátria nacionalidade.
Por tudo quanto aqui em forma de letra, o
coração diton. Com a chancela das emoções mais vivas e naturais, rogo se digne
Vossa Excelência receber e aceitar as minhas congratulações pelo brilho da
forma, excelência do conteúdo e moldura de requintada brasilidaele da
magnífica oração com que registrou, nos Anais do Senado Federal, o transcurso
do "Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial".
Com elevada estima e não menor admiração,
creia-me, fraternalmente - Deputado Carlos Santos.
Dados Básicos:
Data de Nascimento:
09/12/1904 (Falecido em 09/05/1989)
Local de Nascimento:
Rio Grande do Sul, RS
Legislaturas:
1975-1979 e 1979-1983.
Mandatos (na Câmara dos
Deputados):
Deputado Federal, 1975-1979, RS, MDB. Dt. Posse: 01/02/1975;
Deputado Federal, 1979-1983, RS, MDB. Posse: 01/02/1979.
Filiações Partidárias:
ARENA; MDB
Condecorações:
Comenda Pro Eclesia et Pontifice - Papa João XXIII, 1960. Recebeu
igual Comenda do Papa Paulo VI, 1967.
Estudos e Cursos Diversos:
Estudos iniciais no Liceu Salesiano Leão XIII e nos colégios
estaduais Nossa Senhora do Rosário e Lemos Júnior; Bacharel em Ciências
Jurídicas e Sociais - Faculdade de Direito de Pelotas, da Universidade do Rio
Grande do Sul, 1950.
Obras Publicadas:
Predestinação do Direito, Tip. Leão XIII, 1950.
Atividades Parlamentares:
CÂMARA DOS DEPUTADOS: COMISSÕES PERMANENTES: Relações Exteriores: Membro efetivo, 1975.CPI: Problema do Menor: Membro efetivo, 1975, e Presidente, 1975.
CÂMARA DOS DEPUTADOS: COMISSÕES PERMANENTES: Relações Exteriores: Membro efetivo, 1975.CPI: Problema do Menor: Membro efetivo, 1975, e Presidente, 1975.
Ministro Tarsso Genro, a carta do Deputado Carlos Santos ( saudoso)ao senador Itamar Franco ( 1980) seu conterrâneo, mostra a sabedoria gaúcha, com muita paz e harmonia nas coisas políticas, rio grandense, do Brasil e do Mundo, na condição de Ministro da Justiça, pode lhe auxiliar, nas informações de seu Cargo, "política de Integração Racial"
ResponderExcluirWaldimiro de Souza
A Criação do Projeto INTERMODAL (JK), facilitava a vida e o desenvolvimento da população mais carente, Negros e Pobres, pois era um projeto de integração nacional envolvendo, as rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, possibilitando maiores facilidades para as populações menos favorecidas da época, ( negros e pobres), como a educação transporte e energia.
ResponderExcluirHoje os órgãos com o DENIT, já não tem a mesma função executiva, são meramente burocráticos, deixando um grande déficit na área executiva.
Essas ações foram temas de trabalhos parlamentares do saudoso Dep federal Carlos Santos , na comissão de inquérito do Menor Abodonado.
Pedro Figuereido de Souza
Assim como a Carta de Uberaba trata da terra e sua relação do homem com sua terra, também vemos aqui que a revitalização do Velho Chico, primam por insuflar um fôlego novo ao povo ribeirinho. Com a implantação dos meios de conservação da bacia retromencionada temos por tudo a valoração dos habitantes e da terra por extensão. Com essa obra resgata a história nordestina séculos de vida e tradição com melhoria na qualidade de vida do ribeirinho.
ResponderExcluirMaria da Glória Souza Rocha.
É bom ressaltar qua a carta de Uberaba deu início uma nova discussão em um exercício da inteligência, buscando a competente gestão do poder executivo em suas práticas políticas, que o judiciário tem o dever de cumprir sua imperiosa função constitucional de interpretar as leis e julgar e o legislativo exercitar o conceito da existência do parlamento que é o uso da palavra, a expressão do verbo em ação que restitui a dignidade da vida e da nação. Creio no Brassil novo.
ResponderExcluirEvandro Viana, acadêmico em Direito, Brasília.
A proposta do blog O Negro no Brasil atual, trata de documento exarado em 1979, num Congresso Afro-brasileiro, que editou a Carta de Uberaba. De pronunciamento político, e que fala de gestão competente, de estratégia, do exercício da inteligência para entender a sabedoria; no dizer do prof. e cientista Milton Santos, que a Carta de Uberaba seria uma provocação aos cientistas, ao corpo docente e discente das Universidades mundiais. E acrescentou que a criação do navio negreiro pelo continente europeu, bem retratado pelo poeta Castro Alves, liga o continente africano e americano na prática política e de gestão administrativa de tráfico maldito, do caráter humano, gestado nas brumas diabóicas do continente europeu. O que a Europa pode contribuir com a dignidade humana?
ResponderExcluirO QUE É HISTÓRIA?
ResponderExcluirEstudar e pesquisar História, exige cuidados e atenção especiais, principalmente quando trabalhamos com a séries iniciais, pois eles serão homens e mulheres do futuro.
O QUE É HISTÓRIA?
Letra e Música: Luiz Carlos Varella de Oliveira (Março 2001)
I
Eu vou mostrar “prá” voces,
O que a História faz por nós.
Será que estaríamos aqui,
Se não fossem nossos avós.
Ei você onde vai,
Cuide bem dos seus pais.
II
O Brasil no início,
Tinha índios e muitas florestas,
Com a chegada do Branco
Veja só o que nos resta.
Os nativos estão reduzidos
E de nossas matas somente lembranças.
III
Quando Estudamos História,
Compreendemos a nossa existência,
As conquistas nas lutas
Faz aumentar resistências.
As etnias mostrando união
Transformam os rumos de uma nação.
Povo Baiano precisa está unido afim de solicitar do Governo federal e estadual,as publicações de todos livros etc. do Patrono Brasileiro, Doutor,Professor, Investigador, Pesquisador Geógrafo Milton Almeda Santos,e aonde esteja em todas as escolas e Bibliotecas do País http;//onegronobrasil1980.blogspot.com
ResponderExcluir2. em 11 Março, 2009 às 3:18 pm Fernando Conceição
ResponderExcluirPrezada professora Maria Luiza Heine,
escreve Fernando Conceição, jornalista e professor da Faculdade de Comunicação da UFBA. Coordeno um grupo de pesquisa que está levantando dados sobre a vida e as idéias de Milton Santos. O resultado será a publicação da biografia autorizada dele, sob minha responsabilidade. Como ele residiu e foi professor em Ilhéus, pretendo ir a esse município agora em março de 2009 buscar dados e todo e qualquer tipo de informação sobre assunto, inclusive documentos e imagens.
Sei que a senhora poderia colaborar conosco nesse sentido. Dessa forma, gostaria de saber de sua disponibilidade em nos apoiar quando da presença de nossa equipe em Ilhéus. Gostaria de conversar com a senhora e mesmo realizar uma entrevista gravada em vídeo. Bem como com outras pessoas que, se ainda vivas, foram contemporâneas de Milton Santos, colegas dele no professorado, funcionários, amigos e mesmo adversários. .
Aguardo com ansiedade a sua resposta, bem como indicações de pessoas que poderiam complementar a nossa busca de informações sobre a presença de Milton Santos em Ilhéus. Há arquivos da escola, das aulas, sobre alunos dele etc?
Agradeço,
Fernando Conceição.
3. em 13 Março, 2009 às 1:27 pm mlheine
Waldimiro, agradeço sua participação, e concordo com o que diz.
Maria Luiza
4. em 21 Março, 2009 às 11:25 pm Waldimiro de Souza
Ola! Professor Fernando Conceição,
A universidade federal da Bahia, junto com a sua militância e sua amizade com o Doutor Milton Almeida Santos está resgatando a importância da referencia mundial da obra de Milton. No entanto os políticos não entenderam ainda, na sua grande maioria nem sabe da sua existência. Pela sua experiência de jornalista e acadêmico, será que podemos realizar um simpósio ou um seminário internacional no congresso nacional e que a Bahia faça as honras do seu filho mais importante. Fica a sugestão do blog onegronobrasil1980.blogspot.com
5. em 8 Abril, 2009 às 10:08 pm Waldimiro
Parabéns ao povo de Ilhéus, às escolas e universidades e, especialmente, a senhora Maria Luiza Heine juntamente com o Professor Fernando Conceição e a Universidade Federal da Bahia por resgatar toda a contribuição que Milton Santos deixou para a Bahia, o Brasil e a humanidade. Inciativas dessa sorte dá à juventude brasileira motivo de se tornar mulheres e homens com sua responsabildade de construir uma nova civilização.
6. em 9 Abril, 2009 às 12:17 am mlheine
Sr. Waldimiro,
Obrigada por sua participação em nosso blog.
Maria Luiza Heine